“Um abismo chama outro abismo, ao ruído das tuas catadupas;”
Em um estudo sobre o tema “o mundo dos mortos”,
deparei-me com outro, mais específico, sempre relacionando o termo “abismo” com
águas, ou muitas águas.
Em diversas passagens das escrituras sagradas, podemos
ver os dois termos sendo citados, de forma associada, dando a entender que
existe uma relação, pelo menos no sentido da localização do abismo, com as “muitas
águas”.
A partir dessa perspectiva, de que a relação
abismo/águas pode significar uma possível localização do abismo, desenvolverei
este breve estudo.
O conceito de abismo, segundo o dicionário Priberam da língua portuguesa é:
a·bis·mo
(latim *abysmus, de abyssus, -i)
(latim *abysmus, de abyssus, -i)
substantivo masculino
1. Grande profundidade que se supõe insondável e tenebrosa. = PROFUNDEZA
2. Fundo do mar. = PEGO, PÉLAGO
3. O que se compara ao abismo. = DESPENHADEIRO, VORAGEM
4. Situação difícil ou perigosa.
5. Tudo quanto excede o que de si é excessivo.
6. Coisa ou ser misterioso ou incompreensível. = MISTÉRIO
7. Grande separação ou afastamento.
8. [Heráldica] Centro do escudo.
9. [Religião] O Inferno.
"abismo", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, http://www.priberam.pt/dlpo/abismo [consultado em 15-03-2016].
A primeira menção ao abismo encontra-se no livro de Genesis:
“E a terra era sem
forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo; e o Espírito de Deus se
movia sobre a face das águas.”
Já nesses versos iniciais do bereshit, existe a relação do abismo com as muitas águas. Veremos também em outras passagens que “as muitas águas” servem como uma espécie de escudo ou proteção para a entrada do mundo dos mortos.
Em genesis, em um dos trechos mais distintos relacionado às
águas, o dilúvio, temos em 8:2:
Gênesis 8:2
Cerraram-se também as fontes do abismo e as
janelas dos céus, e a chuva dos céus deteve-se.
Êxodo 15:5
Os abismos os cobriram; desceram às profundezas como pedra.
Outras relações vemos também no livro de Jó: Como debaixo de pedra as águas se endurecem, e
a superfície do abismo se congela. (Jó
38:30).
O profeta Jonas quando esteve no ventre do grande
peixe, faz alusão a este momento terrível em sua oração com as seguintes
palavras:
“As águas me cercaram até à alma, o abismo me rodeou, e as algas se enrolaram na minha cabeça.” ( Jonas 2:5).
“As águas me cercaram até à alma, o abismo me rodeou, e as algas se enrolaram na minha cabeça.” ( Jonas 2:5).
De volta ao livro de Jó, lemos quando o Criador
aparece a Jó e pergunta-lhe a respeito do fato de Jó questionar os Seus
caminhos, quando diz
“Ou entraste tu até às origens do mar, ou passeaste no mais profundo do abismo? Ou descobriram-se-te as portas da morte, ou viste as portas da sombra da morte?” (Jó 38:16,17)
“Ou entraste tu até às origens do mar, ou passeaste no mais profundo do abismo? Ou descobriram-se-te as portas da morte, ou viste as portas da sombra da morte?” (Jó 38:16,17)
Esse texto faz alusão às origens do mar, que
são os mais profundos abismos, e complementa com “as portas da morte”, dentro
do mesmo contexto.
Quando Jó faz referência à origem da sabedoria,
aparecem de forma alegórica o abismo e o mar respondendo ao seu questionamento:
“O abismo diz: Não está em mim; e o mar diz:
Ela não está comigo.” (Jó 28:14).
Corrobora esse texto o de Provérbios 8, quando
também fala da origem da sabedoria:
Provérbios 8:22-29
“O Senhor me possuiu no princípio de seus
caminhos, desde então, e antes de suas obras. Desde a eternidade fui ungida,
desde o princípio, antes do começo da
terra. Quando ainda não havia
abismos, fui gerada, quando ainda
não havia fontes carregadas de águas. Antes que os montes se houvessem assentado, antes dos
outeiros, eu fui gerada.
Ainda ele não tinha feito a terra, nem os
campos, nem o princípio do pó do mundo.
Quando ele preparava os céus, aí estava eu, quando traçava o horizonte sobre a face do
abismo; Quando firmava as nuvens acima, quando fortificava as fontes do abismo,Quando fixava ao mar o seu
termo, para que as águas não traspassassem o seu mando, quando compunha os
fundamentos da terra.”
De forma reveladora, Jó cita mais uma vez essa
associação entre as duas palavras no capítulo 26:5, “Os mortos tremem debaixo das águas, com os seus moradores.” O termo
original em hebraico traz por “mortos” a expressão הָ רְ פָ אִ ים “e·rphaim”.
No dicionário bíblico Strong, a raiz פא rapha’, tem como possível tradução “espíritos dos mortos, sombras, espíritos”, uma alusão clara aos rephaims, gigantes de outrora, mortos pelo dilúvio e extintos pelas batalhas do rei Davi e do povo de Israel. Essa citação de Jó 26:5 evidencia que abaixo das “muitas águas” estão “as portas da morte” ou a entrada do mundo dos mortos.
No dicionário bíblico Strong, a raiz פא rapha’, tem como possível tradução “espíritos dos mortos, sombras, espíritos”, uma alusão clara aos rephaims, gigantes de outrora, mortos pelo dilúvio e extintos pelas batalhas do rei Davi e do povo de Israel. Essa citação de Jó 26:5 evidencia que abaixo das “muitas águas” estão “as portas da morte” ou a entrada do mundo dos mortos.
Em seguida temos os Salmos, fazendo referências
as mais diversas sobre essa ligação entre as águas e o mundo dos mortos, com
termos como inferno, perdição, abismo. Vemos em 42:7 o salmista comparando seu
sofrimento ao abismo e ao som das “catadupas” (quedas de água corrente):
Salmos 42:7 “Um abismo
chama outro abismo, ao ruído das
tuas catadupas; todas as tuas ondas e as tuas vagas têm passado sobre mim.”
Salmos 104:6
“Tu a
cobriste com o abismo, como com um vestido; as águas estavam sobre os montes.” Neste
salmo a referência é feita ás águas como cobertura da terra; o abismo foi
coberto pelas muitas águas, as quais lhe serviram de vestido.
Já no Salmos 88, quando o compositor compara seu pesar com o
dos mortos temos:
Salmos 88:4-7
“Estou
contado com aqueles que descem ao abismo;
estou como homem sem forças,
Livre entre
os mortos, como os feridos de morte que
jazem na sepultura, dos quais te não lembras mais, e estão cortados da tua
mão.
Puseste-me no abismo mais profundo, em trevas e nas profundezas.
Sobre mim pesa o teu furor; tu me afligiste com
todas as tuas ondas. (Selá.)”
Dentre outros textos dos Salmos:
Salmos 69:15
Não me leve a corrente das águas, e não me
absorva ao profundo, nem o poço cerre a sua boca sobre mim.
Salmos 107:25-26
“Pois
ele manda, e se levanta o vento tempestuoso que eleva as suas ondas. Sobem aos céus; descem aos abismos, e a sua alma se derrete em angústias.”
Nos profetas:
Isaías 51:10
Não és tu aquele que secou o mar, as águas do
grande abismo? O que fez o caminho no fundo do mar, para que passassem os remidos?
Ezequiel 26:19
Porque assim diz o Senhor DEUS: Quando eu te
fizer uma cidade assolada, como as cidades que não se habitam, quando eu fizer
subir sobre ti o abismo, e as muitas águas te cobrirem,
Ezequiel 31:15
Assim diz o Senhor DEUS: No dia em que ele
desceu ao inferno, fiz eu que houvesse luto; fiz cobrir o abismo, por sua causa, e retive as suas correntes, e detiveram-se
as muitas águas; e cobri o Líbano de preto por causa dele, e todas as
árvores do campo por causa dele desfaleceram.
Habacuque 3:10
Os montes te viram, e tremeram; a inundação das
águas passou; o abismo deu a sua voz, levantou ao alto as suas mãos.
Dessa forma, fica claro em Apocalipse, no juízo do grande
trono branco, o fato de o mar juntamente com o inferno e a morte “darem os
mortos que neles havia”
E deu o mar os mortos que nele havia; e a morte
e o inferno deram os mortos que neles havia; e foram julgados cada um segundo
as suas obras.
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